MEMÓRIAS DE UM NONAGENÁRIO ENAMORADO. Memória das minhas putas tristes. Gabriel Garcia Marques
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Garcia
Márquez, Gabriel. Memória de minhas putas tristes. (11ª ed.)
Traduzido
por Eric Nepomuceno. Rio de Janeiro: Record, 2006. 127 p
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Roberto Carvalho
Mestrando em Educação – Unicamp
Memória de minhas putas tristes, de
Gabriel Garcia Márquez, conta a história de um senhor que no seu 90º
aniversário faz um pedido inusitado a uma amiga de longa data, dona de uma casa
clandestina. O pedido é o de passar uma noite insana com uma adolescente virgem...
não pensem que o livro é um conjunto de contos obscenos; em verdade, eles se
aproximam mais de uma narrativa nostálgica na qual o nosso personagem vai
recordando passagens de sua vida enquanto desfruta, à noite, dos encantos de
sua prenda.
Nosso
nonagenário, ao passar as noites ao lado de sua musa adormecida, redescobre o
sabor pela vida e revê sua trajetória egoísta, sem ter se deixado levar pelo
amor concreto ao lado de uma mulher. “Nunca me deitei com mulher alguma sem
pagar, e as poucas que não eram do ofício convenci pela razão ou pela força que
recebessem o dinheiro nem que fosse para jogar no lixo” (p 16). Essa nova
paixão tardia vai aos poucos devolvendo o sentido de humanidade ao nosso
personagem que, em vários momentos, sonha de olhos abertos com a convivência
diária com uma parceira de vida e alcova que nunca teve.
Mas
quem é esse idoso, que vai se redescobrir e beber da fonte da juventude junto
ao corpo de uma adolescente e viver um sonho de vida nova e de amor? No seu
autorretrato nos conta que era um domador de telegramas - ofício de traduzir
para o jornal as notícias do mundo para a língua nativa - crítico musical,
professor sem mérito e cronista no El Diário de La Paz. Morador de uma mítica
cidade, vivendo em uma casa avarandada e ensolarada, tão velha e carcomida como
ele, e que vai se deixar levar pelas vicissitudes da vida.
Como demonstra bem uma das suas memorias, dos momentos passados com sua bela adormecida. “Na noite de seu aniversário cantei para Delgadina a canção completa e beijei-a por todo o corpo até ficar sem respiração: a espinha dorsal, vertebra por vertebra, até as nádegas lânguidas, o lado da pinta, o de seu coração inesgotável. À medida que a beijava aumentava o calor do seu corpo e ela exalava uma fragrância de montanha.” (p 82)
Trata-se
de uma leitura que conduz a obras como Lolita de Vladimir Nabokov, ou
então A casa das belas adormecidas de Yasunari Kawabata, entrando para
uma tradição de contos que ilustram de forma singular a paixão de homens
maduros por ninfetas (lolitas). No decorrer do conto percebemos o medo do amor,
e o terrível mito da impotência sexual que tanto preocupa o macho latino. Um
conto de uma sensibilidade ímpar, que desnuda de forma lírica as nuances da
alma humana.
Gabriel
José García Márquez, prêmio Nobel de literatura de 1982
pelo conjunto de sua obra. Nascido em Aracataca, 6 de março de 1927 — Cidade do
México, falecido em 17 de abril de 2014, foi um escritor, jornalista, editor,
ativista e político colombiano. Considerado um dos autores mais importantes do
século XX.
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Roberto, muito bem escrito seu texto. Parabéns! Já li Gabriel Garcia Márquez há muito tempo, e recordo com carinho "100 anos de solidão". Hoje, tenho sido tão tomada pelas questões de gênero, que não consigo ler situações como a descrita acima sem desconforto. Enfim, a literatura pode gerar muitos sentimentos: acalentar, provocar, incomodar...
ResponderExcluirRoberto, parabéns pela resenha. Nunca li esse livro, só tive contato com os comentários sobre ele. Recordei nesse momento a apresentação da Caroline sobre hedonismo com a imagem daquele casal.
ResponderExcluirMuito obrigada pela resenha, pois tenho muita curiosidade há anos para ler esta obra.
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