AMERICANAH. Chimamanda Ngozi Acichie
Gabriela Barbosa Souza
O romance Americanah, da escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie, desenvolve-se tendo como referência espácio-temporal a Nigéria na década de 1990, marcada por um governo ditatorial que controlava o país. A obra é narrada em 3ª pessoa e aborda a onda de pobreza e desvalorização da educação, que assolava as universidades públicas do país. A jovem Ifemelu, personagem protagonista da narrativa, morava e estudava em universidade pública naquele país, onde vivia um amor terno com Obinze.
As greves e esvaziamento nas universidades levaram Ifemelu a se mudar para os Estados Unidos e viver os dilemas da separação de seu namorado e familiares que ficaram na Nigéria, além dos grandes desafios vivenciados pela personagem, mediante a falta de reconhecimento de cidadania americana, dificuldades para encontrar empregos, preconceitos linguísticos e raciais, dentre outros. Nos Estados Unidos, a jovem vivia os dilemas de uma estrangeira diante de uma nova realidade social que a via sempre como uma imigrante que deveria voltar para seu país de origem. Para lidar com esses desafios,
Ifemelu contava com os conselhos e apaziguamentos de Obinze, seu amor que havia ficado na Nigéria.
No entanto, no processo de procura de empregos e diante de sua conta bancária cada vez mais negativa, Ifemelu acabou tendo que vender carícias em seu próprio corpo para um homem, o que a levou a romper todos os contatos com Obinze, por considerar aquele ato como uma traição irreparável. Mesmo não tendo contato com Ifemelu, Obinze buscava ir ao encontro dela nos Estados Unidos, como combinado quando ela saíra da Nigéria, o que não foi possível devido ao acontecimento do 11 de Setembro, quando os Estados Unidos impediu a entrada de imigrantes no país. Diante desses dilemas, Ifemelu vivenciou outros relacionamentos amorosos nos Estados Unidos, o que muitas vezes desloca a atenção do leitor para outras personagens ao longo da narrativa, além do casal amoroso protagonista.
A busca constante por empregos e paz naquele país que não a representava se fez presente em boa parte da trajetória de Ifemelu, até que decidiu criar um blog para manifestação de suas vivências e observações naquela realidade e evidenciar o quão difícil era a vida de um negro nos Estados Unidos, o qual foi intitulado “Observações curiosas de uma negra não americana sobre a questão da negritude nos Estados Unidos”. O romance evidencia de forma clara as questões raciais vividas pela personagem, ao se deparar com uma realidade de população majoritariamente branca.
Após quinze anos nos Estados Unidos, Ifemelu sente a necessidade de voltar ao seu país de origem e reencontrar Obinze, mesmo encontrando resistência de seus familiares que não viam em seu retorno uma boa opção devido à situação social e econômica da Nigéria. No entanto, essas opiniões não foram capazes de sufocar a opção de Ifemelu, a qual rompe com os laços com os Estados Unidos para retornar a Nigéria em busca de encontrar Obinze, que já está casado. A chegada à Nigéria foi um choque para a personagem que desconhecia alguns aspectos do país em que nasceu e que ao mesmo tempo não gostava dos problemas que ali encontrava. Após o reencontro com Obinze, Ifemelu viveu o dilema de o dividir com sua esposa e filha, o que gerava um clima de conflitos cotidianos. Por fim, o casal consegue romper com os desafios e encontrar um espaço em suas vidas para vivenciar o romance que norteia a obra.
O romance Americanah é uma viagem para o leitor que passeia entre a fantasia e a reflexão acerca das relações espácio-temporais que são marcantes na narrativa. A partir da leitura da obra, uma reflexão fecunda pode ser feita sobre os estereótipos criados socialmente e culturalmente em relação a um determinado lugar. As idas e vindas entre a Nigéria, território de origem da personagem, e os Estados Unidos, território de destino, possibilitou dar visibilidade ao processo de construção identitária da personagem, marcada por hábitos culturais e linguísticos de ambos os lugares, o que possibilitava a personagem o estranhamento de costumes, língua e hábitos alimentares.
A expressão Americanah que intitula o livro refere-se às estranhas afetações linguísticas adquiridas por pessoas que se deslocam para os Estados Unidos, eixo central da narrativa que se desenvolve a partir do processo de construção identitária da personagem diante dos deslocamentos culturais e dos rompimentos de fronteiras culturais e espaciais.
Americanah tem um amplo potencial reflexivo, ao utilizar a linguagem narrativa em prosa para abordar vários dilemas sociais, tais como: o papel da mulher na sociedade, os dilemas da imigração, questões raciais, os desafios de uma pessoa depressiva, os desafios das universidades públicas, dentre outros. A abordagem desses dilemas sociais na obra acontece em outro espaço social, mas possibilita uma reflexão contínua do leitor ao relacionar com seu próprio espaço e tempo em que se ler.
Esta obra foi vencedora do National Book Critics Circle Award e eleito um dos 10 melhores livros do ano 2014 pela NyTimes Book Rewiew. Para os leitores que buscam uma obra densa e com alto potencial reflexivo sobre temas atuais no que se refere à questões raciais e de imigração, a obra é super indicada.
Referência: ADICHIE, Chimamanda Ngozi. Americanah. Tradução de Julia Romeu. São Paulo: Companhia das Letras, 2014.



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