LEITURA, PAZ E CURA
LEITURA, PAZ E CURA
____________________________________________________________________________
BO-REUM, Hwang. Bem-vindos à livraria Hyunam-Dong. Tradução de Jae Hyung Woo. Rio de Janeiro: Editora Intrínseca, 2023. 271p.
___________________________________________________________________________
Daniel Santos
Franciscão
Faculdade de
Educação, Unicamp
Inesperado e profundo. O
romance Bem-vindos à livraria Hyunam-Dong conta a história de Yeongju e
dos desafios que enfrenta para concretizar o seu sonho de estabelecer uma
livraria de bairro após sofrer um burnout e largar o seu passado:
marido, carreira e família. No virar das páginas, entretanto, descobrimos que a
obra é muito mais complexa do que esse enredo inicialmente sugere.
O desenvolvimento do
livro é um pouco diferente dos romances ortodoxos, onde os capítulos dão
continuidade aos acontecimentos apresentados nos capítulos anteriores. Não que
isso não ocorra em Bem-vindos à livraria Hyunam-Dong, mas muitos
capítulos contam eventos independentes. Narrar a história de forma cartesiana não é objetivo, e isso de forma alguma
faz dela uma obra superficial.
Nesse sentido, leitura flui sem altos e baixos,
suspenses e grandes emoções. Características que são comuns ao gênero
sul-coreano healing fiction (ficção de cura), explorado pela
autora de 30 anos, Hwang Bo-Reum.
A ideia dessa categoria
de romances é servir de abrigo para o leitor mediante a uma leitura simples e
ambiente acolhedor, valorizando conexões humanas e dramas leves. Nas palavras
da autora, ao final do livro: “Queria
escrever sobre um lugar para onde vamos quando queremos escapar das obrigações
do dia a dia, um local onde não há ninguém nos criticando ou cobrando algo, um
refúgio onde podemos descansar, parar e respirar.” (p. 270).
Esse papel é claramente
cumprido pela livraria. Capítulo a capítulo, ela transforma-se no principal
pano de fundo da trama e abriga interações humanas que possibilitam às personagens
expor as suas feridas, ouvir conselhos e evoluir enquanto seres humanos. Quando
não solucionando dilemas, as vivências na livraria permitem a elas reunir
forças para dar o próximo passo e lidar com as suas inseguranças, medos e
frustrações. Sobre a livraria, Yeongju, mesmo diante dos desafios para
mantê-la, afirma: “Acho que me tornei uma
pessoa melhor por causa da livraria… aqui aprendi a compartilhar e doar… eu amo
este lugar, amo as pessoas que conheci aqui.” (p. 255)
Enquanto nos apresenta as
adversidades de Yeongju para impulsionar o crescimento da livraria, a obra
explora impasses da vida contemporânea por meio do desenvolvimento da história
das demais personagens do romance: funcionários, escritores e clientes da
livraria. São explorados temas como trabalho, relacionamentos familiares,
planejamento futuro, controle das emoções e, ao final do livro, quase que como
um prêmio ao leitor, a paixão.
Longe de ser um livro de
autoajuda, é especialmente interessante para quem está passando por um momento
difícil ou sentindo-se ansioso (e quem não está?). A cadência dos
acontecimentos e a repercussão adequada dos dilemas possibilitam a leitura
reconfortante que o gênero promete. Reflexões mais profundas ficam por conta do
leitor.
Oi, Daniel! Estava curiosa por ler seu comentário sobre esse título. Adoro livros sobre livros, bibliotecas, livrarias - e gatos! Há vários deles, coreanos, que têm chegado no mercado, mas percebo que há uma predileção especial do público por esse que você leu...
ResponderExcluirInteressante essa ideia que une leitura à cura... Na Grécia Antiga, inventaram a palavra "Biblioterapia" pra isso... E cá estamos nós, voltando-nos para esta sabedoria... 😊
Obrigada pelo texto!
Adorei a temática de vidas em uma livraria! Parece um livro reconfortante e acolhedor. Sua resenha me deu vontade de lê-lo! Parabéns pelo texto!
ResponderExcluirDaniel! Nas últimas livrarias que entrei, em todas elas avistei esse livro escolhido por você. Em nenhuma, dessas vezes me aproximei do livro, pois esperava que conheceria ele por meio do seu comentário... E esse trecho foi <3: "e, ao final do livro, quase que como um prêmio ao leitor, a paixão". A sensação que tive pelo seu comentário da obra, é de um romance como equílibrio entre leveza e profundeza... Gosto dessa proposta!
ResponderExcluirEu não conhecia até a leitura do seu comentário, Daniel, o estilo sul-coreano literário (aliás ainda não faz parte da minha vida conhecer as produções orientais, ainda estou aqui presa na mídia/produções ocidentais). Mas esta chegando mais essa opção na minha lista, além de conhecer os doramas. Para terminar, fiquei com vontade de experimentar esse estilo de vida nas bibliotecas...
Adorei a maneira como você aborda as complexidades da obra e do seu olhar atento à forma de escrita do autor no tecer dos capítulos independentes, Daniel. Seu comentário me provocou à leitura do livro! Muito obrigada!
ResponderExcluir